HOMILIA
O Tempo da Plenitude e o Tempo da Busca
Amados peregrinos da verdade, o Evangelho de hoje nos coloca diante de uma questão essencial da existência: o equilíbrio entre a presença e a ausência, entre o tempo da celebração e o tempo da busca. Os discípulos de João se perguntam por que jejuam, enquanto os seguidores de Cristo parecem isentos dessa prática. E a resposta do Mestre revela uma profunda realidade: há momentos em que a luz se faz presente e nos nutre diretamente, e há momentos em que sua aparente ausência nos convida a um esforço consciente para encontrá-la.
Em nossa era, vivemos tempos de grande aceleração, onde a busca por respostas instantâneas e soluções rápidas obscurece o valor da espera e da preparação. Aprendemos a saciar nossas necessidades imediatas, mas, ao fazê-lo, muitas vezes negligenciamos o espaço necessário para a interioridade, para o amadurecimento do ser. O jejum que Jesus menciona não se limita à renúncia alimentar; ele se expande como símbolo de uma escolha livre e consciente de afastar-se do supérfluo para permitir que a essência brilhe com maior clareza.
Nossa sociedade enfrenta desafios imensos: a fragmentação das relações, o vazio disfarçado de excesso, a inquietação de um mundo que corre sem saber para onde. Mas também há virtudes, pois nunca houve tanto acesso à consciência da dignidade humana, nunca estivemos tão próximos de reconhecer que a liberdade não é mero direito, mas vocação. No entanto, a verdadeira liberdade não é fazer tudo o que queremos, mas direcionar nossa vontade ao que verdadeiramente nos realiza.
Assim, o jejum, entendido em sua profundidade, torna-se um ato de soberania do espírito. Não uma imposição externa, mas uma decisão interna de elevar-se, de transformar ausência em desejo autêntico, de converter privação em ascensão. Como Cristo nos ensina, quando o esposo está presente, há plenitude; mas quando nos parece distante, cabe a nós buscá-lo com determinação.
Que estejamos atentos ao tempo da celebração e ao tempo da busca. Que saibamos reconhecer a presença da verdade quando ela brilha, mas também aprender a jejuar das ilusões quando o silêncio se faz necessário. Pois é na liberdade da escolha consciente que o espírito encontra seu caminho para a luz.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Ausência do Esposo e o Jejum como Caminho da Plenitude
A frase "Dias virão, porém, em que lhes será tirado o esposo, e então jejuarão" (Mateus 9,15) carrega uma profundidade teológica que ultrapassa o contexto imediato dos discípulos de João Batista e dos fariseus. Jesus não apenas responde a uma questão sobre o jejum, mas revela uma dinâmica essencial da relação entre Deus e a humanidade, entre plenitude e privação, entre presença e busca.
1. O Esposo como Símbolo da Plenitude Divina
Na tradição bíblica, a imagem do esposo é recorrente para expressar a relação entre Deus e seu povo (Os 2,16-22; Is 54,5-8). Jesus se apresenta como o verdadeiro Esposo, aquele que sela a nova e definitiva aliança, oferecendo não mais uma lei externa, mas a comunhão plena com Ele. Enquanto Ele está presente, seus discípulos vivem a experiência da intimidade divina, onde a privação não se faz necessária, pois a própria Fonte da Vida caminha com eles.
Porém, sua presença física não será permanente. Ele será "tirado", referindo-se primariamente à sua paixão e morte. Mas esse afastamento não é apenas um evento histórico: simboliza também os momentos em que a humanidade experimenta a ausência sensível de Deus, a aparente retirada da graça, o tempo da prova e da maturação espiritual.
2. O Jejum como Caminho de Busca e Elevação
O jejum, então, aparece como a resposta adequada a essa ausência. Ele não é uma simples privação, mas um movimento de interiorização e transcendência. Quando o esposo está presente, a alegria é espontânea; quando ele se retira, o discípulo é chamado a aprofundar sua sede por Ele. Esse "jejum" pode ser entendido em múltiplos níveis:
- Jejum físico: A privação do alimento como um exercício de desapego e de domínio da vontade, preparando a alma para uma comunhão mais profunda.
- Jejum interior: A experiência do silêncio, da espera, da purificação das afeições, onde o crente aprende a desejar Deus não apenas pelos dons que recebe, mas por Ele mesmo.
- Jejum existencial: O tempo de provação e aridez espiritual em que a alma é chamada a perseverar na busca, sem apoios sensíveis, caminhando na fé pura.
Esse jejum não é apenas uma resposta passiva à perda, mas uma ascensão da liberdade do discípulo, que, ao experimentar a ausência, decide elevar-se na busca do reencontro com o Absoluto.
3. O Esposo Não é Definitivamente Tirado, Mas Oculto
O afastamento do Esposo não é um abandono definitivo. Ele ressuscita, mas sua presença já não é física como antes. Ele se torna presente de maneira nova: no Espírito Santo, na Eucaristia, na Igreja, na interioridade do crente. O jejum, então, torna-se um aprendizado do olhar: um exercício para reconhecer sua presença velada, para amadurecer o amor, que já não se baseia na evidência, mas na fidelidade.
A dinâmica dessa frase resume a jornada da alma: há momentos de plenitude em que a presença divina é clara e sensível, e há momentos de noite e jejum, onde a fé é purificada e elevada. Assim, a espiritualidade cristã se constrói na oscilação entre a festa e a espera, entre a plenitude e o jejum, até que chegue o dia definitivo, onde o Esposo será plenamente revelado e já não haverá mais necessidade de jejuar.
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
Leia também:
#evangelho #homilia #reflexão #católico #evangélico #espírita #cristão
#jesus #cristo #liturgia #liturgiadapalavra #liturgia #salmo #oração
#primeiraleitura #segundaleitura #santododia #vulgata
Nenhum comentário:
Postar um comentário