HOMILIA
O Encontro na Galileia Interior
Irmãos e irmãs,
Do sepulcro vazio não emana apenas o eco de um milagre antigo, mas o convite eterno à travessia interior. O Evangelho de hoje nos mostra mulheres que, movidas pelo temor e pela alegria, correm. Correm porque algo nelas foi despertado — algo que não pode mais ser contido pelo peso da pedra que selava a ausência.
Jesus lhes aparece e diz: “Não temais.” Esta não é uma palavra para acalmar os sentidos, mas um chamado à liberdade profunda, aquela que não se curva diante das ordens impostas por fora, mas se ergue pela fidelidade a uma voz que ressoa no âmago do ser. A Galileia para onde os discípulos são enviados não é apenas um ponto no mapa; é um espaço da alma onde se dá o reencontro com o sentido vivo.
Enquanto alguns forjam narrativas para sustentar estruturas de controle, outros, despertos pela luz, ousam caminhar rumo ao invisível. E este invisível não é ausência, mas plenitude em gestação. Ele se revela àqueles que, como as mulheres do Evangelho, se dispõem a tocar os pés do Ressuscitado, não como súditos, mas como seres conscientes da dignidade que brota do amor verdadeiro.
A ressurreição não é fuga do mundo: é sua transfiguração a partir de dentro. Cristo, ao chamar de “irmãos” os que o abandonaram, não apenas perdoa — Ele revela que a comunhão nasce da escolha por amar livremente, não da imposição de uma lei. O Ressuscitado reina não por domínio, mas por presença, e essa presença vibra em cada ser que, mesmo sem compreender tudo, se levanta e caminha.
Ide, pois, à Galileia do vosso espírito. Lá Ele vos precede. Lá, vereis o que já vos habita.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A frase: “Então Jesus lhes disse: Não temais; ide, anunciai a meus irmãos que vão para a Galileia: lá me verão” (Mt 28,10), carrega, em sua simplicidade aparente, um dos cumes mais elevados da revelação cristã pós-ressurreição. A profundidade teológica deste versículo pode ser contemplada em três eixos: o não temer, o envio, e a Galileia como lugar do reencontro.
1. "Não temais" — A libertação do medo como condição para o ver
No momento em que as mulheres encontram o Ressuscitado, sua experiência se dá entre o temor e a alegria (v.8). Jesus inicia sua fala com “Não temais”, ecoando a constante exortação divina nas Escrituras a não sucumbir ao medo (cf. Is 41,10; Lc 1,30). Aqui, o medo não é apenas emoção humana, mas símbolo da antiga condição: o estado de separação entre a criatura e o Criador. A palavra de Cristo não é mero consolo, mas performativa — ela transforma. Ao dizer “não temais”, Jesus recria o ser interior, capacitando-o a reconhecer a luz da presença divina. A visão d’Ele está condicionada à libertação interior.
2. "Ide, anunciai a meus irmãos" — A elevação do vínculo e a missão livre
Jesus chama os discípulos de “meus irmãos”. Essa escolha não é trivial: é a consagração de uma nova ordem de relação. Aqueles que o abandonaram são reintegrados não como servos, mas como irmãos. A ressurreição inaugura uma nova economia do amor, onde o vínculo é dado pelo Espírito, não pelo sangue ou mérito. O envio que se segue (“ide, anunciai”) é, assim, a expressão de uma missão nascida da confiança e não da obrigação. É uma missão que parte da experiência de quem viu — não com os olhos físicos apenas, mas com o coração purificado pela presença do Vivente.
3. "Que vão para a Galileia: lá me verão" — Galileia como símbolo da origem e do recomeço
A Galileia, na geografia teológica de Mateus, é mais que um lugar físico: é o solo onde tudo começou (cf. Mt 4,12-17), onde Jesus chamou os primeiros discípulos, realizou curas, proclamou o Reino. Voltar à Galileia é voltar às origens, mas agora com os olhos abertos pela cruz e pela ressurreição. A promessa “lá me verão” indica que a verdadeira visão do Ressuscitado se dá não em Jerusalém, lugar do poder e do sacrifício, mas na Galileia, lugar da vida cotidiana, do anúncio e do chamado. A experiência da glória não exclui o mundo, mas o ilumina a partir de dentro.
Conclusão
Essa frase concentra o coração do cristianismo: a superação do medo pela presença de Cristo, o envio livre e fraterno para o testemunho, e o reencontro com o Ressuscitado no espaço da origem — onde a fé se fez chamada. A visão de Cristo, portanto, não é apenas futura ou celestial, mas presente, concreta, enraizada no retorno ao lugar interior onde fomos chamados a ser plenamente livres.
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